Breno Ruiz - Cantilenas Brasileiras
O disco ‘Cantilenas Brasileiras’ reúne 12 canções de Breno Ruiz em parceria com um dos mais importantes letristas do país, Paulo Cesar Pinheiro. E conta com a presença dos músicos Neymar Dias (contrabaixo acústico e viola caipira), Igor Pimenta (contrabaixo acústico), Pedro Alterio (violões), Gabriel Alterio (bateria e percussões), além das participações especiais de Renato Braz e Mônica Salmaso. A produção e os arranjos são do próprio compositor, que também atua nesse trabalho tocando piano e acordeon.
Breno Ruiz mostra por que virou referência entre músicos de Rio e SP / Compositor paulista estreia em disco com ‘Cantilenas brasileiras’
por Hugo Sukman*
Quando em 1991, com 15 anos de carreira como o maior compositor desconhecido do Brasil, Guinga lançou seu primeiro disco, “Simples e absurdo”, o parceiro Aldir Blanc dizia, sem medo de exagerar:
.
— Guinga é o maior compositor brasileiro surgido desde Djavan.
.
Aldir referia-se ao universo musical novo que Guinga abria, e que precisava ser anunciado e gravado em nome da sobrevivência da música brasileira. Não errava, nem exagerava: Guinga seria o maior e mais influente compositor brasileiro dali em diante.
.
Há 15 anos, Breno Ruiz é o maior jovem compositor desconhecido do Brasil. E agora, que lançou seu primeiro disco solo, “Cantilenas brasileiras”, (com dois concertos na Casa do Choro, ontem e quarta), seu parceiro Paulo César Pinheiro afirma, sem medo de exagerar:
— A música do Breno vem do século XIX para o XXI sem passar pelo XX.
.
Nem 34 anos, visual e modo de vida de um rapaz de seu tempo, o paulista Breno Ruiz já foi gravado pelo MPB4, por Renato Braz e Quarteto Maogani e por cantores da nova geração, como Ilana Volcov e Dani Gurgel. Mito entre ouvintes do Rio e de São Paulo, deixou Maurício Carrilho pasmo em sua estreia carioca. É a hora da descoberta.
.
“Meu carrilhão de sons/ Vem de tempos bons/ Vem do forrobodó/ Tinha a Chiquinha/ Tinha o Callado/ Bordando o choro e fechando o nó/ Por isso um som, pra mim/ Se ele for chinfrim/ Não passa no filó”.
.
Os versos de Paulo César Pinheiro para o “Choro bordado” dizem muito. Mas podem enganar. De fato, o choro, em três partes, poderia ter sido feito por Chiquinha Gonzaga ou Joaquim Callado, pioneiros do gênero. E, sim, essa tradição deu a Breno um padrão que torna seu som nada chinfrim. Mas no “carrilhão de sons”, na forma como harmoniza o choro e até no seu improviso ao piano percebe-se logo a modernidade que contém.
.
— Meu objetivo com a música popular é criar síntese, chegar às pessoas de forma intuitiva, fácil de ouvir — diz. — Não acredito que o moderno seja o novo. Mas a renovação. É voltar de forma atual ao mesmo lugar. A brincadeira é essa.
Começo num orgãozinho elétrico amador
Breno é músico desde que se entende por gente, aos 4, 5 anos, na Itapetininga natal, interior de São Paulo, vizinha a Tatuí, que tem hoje em seu Conservatório uma das principais escolas de música do país. Lá, estudou cinco anos de piano clássico e um de popular, embora fosse sempre autodidata.
.
— Um dia meu professor me disse: “Eu não vou mais te dar aula. Tudo que você precisa tem nas mãos e na cabeça” — lembra. — Minhas referências são muito intuitivas. Nunca toquei Callado, Chiquinha, (Ernesto) Nazareth. Nem Villa-Lobos. Mas tudo isso está dentro de mim e da minha criação.
.
O caminho de Breno para a música parece um romance. De família com tradição cultural e musical, nasceu num período de decadência econômica. Começou tocando um orgãozinho elétrico amador. Incentivado por um tio acordeonista amador, aos 10 já tocava em baile. Era assistente de um músico (amador) num centro espírita, onde acabou como regente do coral. Ali conheceu o músico, compositor e produtor, aí sim profissional, Rafael Alterio, do estúdio Gorgolândia, referência de gravação de música brasileira em São Paulo.
.
— Fui adotado como filho por Rafael e a mulher dele, Rita Alterio, letrista, minha primeira parceira. Foi a ele que mostrei uma primeira música, e a emoção que isso despertou nele e a minha emoção com sua música me mostraram o caminho.
.
Foi então que Breno Ruiz descobriu que tudo de que gostava tinha o dedo de um tal Paulo César Pinheiro. Eram o “Matita Perê”, do Tom Jobim, as músicas de Baden Powell e o “Senhorinha”, de Guinga, que Mônica Salmaso acabara de gravar.
.
— Minha música só faria sentido se tivesse aquela poética junto. E aí começou uma saga de encontrar o Paulinho, o que durou dois anos.
.
Na época Pinheiro era um dos donos do Teatro Clara Nunes e, do interior de São Paulo, Breno ligava para lá obsessivamente.
.
— Recebi uma fita do Breno com uma música linda e um número de telefone. Liguei. Ele nem acreditou — recorda Pinheiro, 12 anos depois. — Eu disse que precisava ouvir, para saber se não era compositor de uma música só. Ele me mandou quatro. Vi que era muito especial.
A troca de telefonemas e fitas durou dois anos até a parceria de fato começar.
.
— Ele queria me conhecer. Disse que aprendeu com Vinicius a só compor com quem antes olhava no olho. Antes de ser parceiro tinha que ser amigo — diz Breno que, com o dinheiro do cachê de um baile, pegou um ônibus e veio ao Rio.
.
— Assim que cheguei à casa dele encontrei o Paulinho, a Luciana ( Rabello, cavaquinista e mulher de Pinheiro ), e a Amelia ( Rabello, cantora, irmã de Luciana ) ouvindo minhas músicas. Luciana perguntou: “De onde você tirou esses lundus?”. Eu, a rigor, não sabia o que era um lundu.
.
A tal intuição fez Breno compor gêneros ancestrais da música brasileira. “Como pode alguém criar com tanta intimidade e fundamento sem ter conhecimento do que faz e a dimensão exata da sua arte? Estudou música, obviamente, mas o que ele faz não se aprende nos livros”, escreveu Luciana no texto que acompanha o encarte do disco.
“Sabe quem ia adorar te conhecer?”
Aquele primeiro lundu virou a canção “Estrela banca”. E foram nascendo outros, como “Dança de mucama”, “Roxinha”, “Donana”, simples mas elaboradíssimas, construídas como peças clássicas, mas com a sensualidade da música popular.
.
Em pouco tempo, Breno tornou-se um mito entre os músicos de Rio e São Paulo.
.
— Tenho tendência à misantropia, à melancolia, quase não saio. Gosto do silêncio da minha casa. Não é ruim, as coisas bonitas têm esse sabor, essa dolência — diz Breno, que vive em São Paulo dando aula de piano e tocando em shows como os da parceira Cristina Saraiva e do cantor Renato Braz.
.
A cada música que saía, um espanto: os ecos de um Caymmi denso em “Marinheiro do mar”. As villalobianas “Modinha triste” e “Cantilena serteneja”, ou a modas caipira e sofisticadíssima “Caçada de onça”. Tudo muito impressionante. Tanto que, no fim do show de quarta-feira na Casa do Choro, Paulo César Pinheiro vira para Breno e, diante do parceiro espantado, afirma:
.
— Sabe quem ia adorar te conhecer, ia te levar para casa para tocar junto? O Tom.
* Hugo Sukman (25 de novembro 2016)
Disco ‘Cantilenas Brasileiras’ • Breno Ruiz • Selo Independente • 2016
É o primeiro álbum solo do compositor Breno Ruiz (piano, voz)
Canções / compositores:
1. Marinheiro do mar “Porto de Araújo nº2” (Breno Ruiz e Paulo César Pinheiro)
2. Estrela branca (Breno Ruiz e Paulo César Pinheiro)
3. Flor lilás (Breno Ruiz e Paulo César Pinheiro)
4. Choro bordado (Breno Ruiz e Paulo César Pinheiro) | Participação especial: Mônica Salmaso
5. Dança de mucama (Breno Ruiz e Paulo César Pinheiro)
6. Roxinha (Breno Ruiz e Paulo César Pinheiro)
7. Donana (Breno Ruiz e Paulo César Pinheiro)
8. Caçada de onça (Breno Ruiz e Paulo César Pinheiro)
9. Modinha triste (Breno Ruiz e Paulo César Pinheiro) | Participação especial: Renato Braz
10. Cantilena sertaneja (Breno Ruiz e Paulo César Pinheiro)
11. Viola de bem querer (Breno Ruiz e Paulo César Pinheiro) | Participação especial: Renato Braz
12. Roseira (Breno Ruiz e Paulo César Pinheiro)
– ficha técnica –
Faixa 1 – Breno Ruiz: Piano, acordeon, voz; Neymar Dias: Contrabaixo; Pedro Altério: Violão; Gabriel Altério: Bateria | Faixa 2 – Breno Ruiz: Piano, voz; Neymar Dias: Contrabaixo; Pedro Altério: Violão; Gabriel Altério: Bateria | Faixa 3 – Breno Ruiz: Piano, voz | Faixa 4 – Breno Ruiz: Piano, voz; Neymar Dias: Contrabaixo; Gabriel Altério: Bateria; Renato Braz: Efeitos; participação – Mônica Salmaso: Voz | Faixa 5 – Breno Ruiz: Piano, voz | Faixa 6 – Breno Ruiz: Piano, voz; Neymar Dias: Contrabaixo, viola caipira; Pedro Altério: Violão; Gabriel Altério: Bateria | Faixa 7 – Breno Ruiz: Piano, voz; Neymar Dias: Contrabaixo; Pedro Altério: Violões; Gabriel Altério: Bateria | Faixa 8 – Breno Ruiz: Piano, voz; Renato Braz: Flautas, percussão, efeitos | Faixa 9 – Breno Ruiz: Piano; Igor Pimenta: Contrabaixo; participação – Renato Braz: Voz | Faixa 10 – Breno Ruiz: Piano, voz; Neymar Dias: Contrabaixo; Pedro Altério: Violões | Faixa 11 – Breno Ruiz: Piano, voz; Igor Pimenta: Contrabaixo; participação – Renato Braz: Voz | Faixa 12 – Breno Ruiz: Piano, voz || Produção musical e arranjos: Breno Ruiz | Gravado na Gargolândia em janeiro de 2011 por Rafael, Gabriel e Pedro Alterio /Exceto faixas 4, 9 e 11, gravadas por Mário Gil no estúdio Dançapé | Mixagem e masterização no Estúdio Dançapé, entre janeiro de 2015 e junho 2016, por Mário Gil | Foto (encarte): Sergio Ferreira | Arte da capa e encarte: Malkovich Design e Comunicação | Texto de encarte: Luciana Rabello | Apoio: Gargolândia | Realização: Laje Produtora | Selo: Independente | Distribuição: Tratore | Cat.: -*- | Formato: CD / Digital | Ano: 2016 | Lançamento: 23 de novembro | ♪Ouça o álbum: Spotify / Apple Music / Deezer / Youtube.
Leia também
:: ‘Mar Aberto’, álbum de Roberto Leão, Breno Ruiz, Mario Gil e Renato Braz
:: Álbum ‘Cantilenas Brasileiras’ | Breno Ruiz
:: Álbum ‘Alegria’ | Breno Ruiz e Roberto Leão
:: Álbum ‘Diferente’ | Breno Ruiz e Miguel Rabello
:: Breno Ruiz lança álbum “Pequenas Impressões sobre o caos”
:: ‘Milagres’ – álbum de Alice Passos e Breno Ruiz, lançado pela Biscoito Fino
Breno Ruiz – nascido em 1983 em Sorocaba, mudou-se imediatamente para a vizinha Itapetininga, onde conheceu sua vocação. Cursou piano no Conservatório Dramático e Musical Dr. Carlos de Campos (Tatuí/SP), sem, contudo, concluir a formação. Tem entre seus parceiros Rafael e Rita Alterio, Socorro Lira, Cristina Saraiva, Sergio Natureza, Celso Viáfora, Dani Black, Tetê Espíndola e Paulo Cesar Pinheiro – este, seu parceiro mais constante. Suas composições são gravadas por intérpretes como Renato Braz, Maogani, MPB4, Tetê Espíndola e Celso Viáfora, entre outros. Ao lado de Renato Braz, Mário Gil e Roberto Leão, lançou o álbum ‘Mar Aberto‘ em abril de 2016. O disco foi lançado no Brasil e Portugal e contou com a participação especial de Dori Caymmi.
.
> Siga: @ruizbreno
.
.
.
Série: Discografia da Música Brasileira / Memória da Música brasileira / MPB / Canção / Álbum.
* Publicado por ©Elfi Kürten Fenske
Artistas se encontram em um álbum visceral que atravessa o teatro musical brasileiro e os…
Evito utilizar o termo fascista com descuido. Conheço seu peso histórico, suas origens, seus desdobramentos…
Série Jazz todas as noites, apresenta: a brasileira ganhadora do grammy, Luciana Souza e a…
Após uma maratona de mais de 200 shows e um super DVD em 2024, Dino…
Nise em Nós comemora os 120 anos da psiquiatra Nise da Silveira com temporada no…
Com o objetivo de mostrar a força, o talento e a representatividade de artistas femininas…