CRISTOVÃO BASTOS (compositor, pianista, arranjador, diretor musical e professor), nascido no bairro de Marechal Hermes, na cidade do Rio de Janeiro, em 3 de dezembro de 1946. Respeitado e admirado por grande parte da música brasileira, estudou teoria musical e acordeom desde cedo, formando-se aos 13 anos, quando iniciou sua carreira, tocando em bailes com a banda de “Creso Augusto”. Sua estreia como pianista foi aos 17 anos, numa boate em Cascadura, subúrbio do Rio de Janeiro. Foi um dos fundadores da Banda Black Rio, participando de sua primeira formação e do primeiro disco, o antológico “Maria Fumaça” em 1976. No mesmo ano participou como solista, juntamente com flautista Copinha, do disco Memórias Chorando de Paulinho da Viola.
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Parceiro de grandes nomes como Chico Buarque — com quem compôs “Todo o sentimento” e “Tua cantiga” —, Paulo César Pinheiro, Aldir Blanc, Paulinho da Viola, Elton Medeiros, Luciana Rabello e Abel Silva. Cristovão criou e assinou arranjos para discos e shows de Nana Caymmi, Edu Lobo, Elza Soares, Emílio Santiago, Fafá de Belém, Miúcha, Gal Costa, Nelson Gonçalves, Paulinho da Viola, Ângela Maria, Chico Buarque, entre outros.
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Algumas de suas composições estão registradas nas vozes e instrumentos de nossos maiores intérpretes, como Zezé Gonzaga, Simone, Ney Matogrosso, Maria Bethânia, Verônica Sabino, os grupos Época de Ouro e Nó em Pingo D’água, Maria Creuza, Paulinho da Viola, Elizeth Cardoso, Emílio Santiago, Zé Nogueira, Mauro Senise, Marco Pereira, entre outros. Em 1998, a cantora Clarisse Grova gravou Novos Traços, disco de músicas inéditas de Cristovão e Aldir Blanc, com produção de Rildo Hora. Barbra Streisand gravou ‘Let´s start right now’, versão da música ‘Raios de luz’ parceria dele com Abel Silva, no álbum A Love Like Ours (1999).
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Com Aldir Blanc, Cristovão compôs mais de vinte canções, entre elas, ‘Resposta ao tempo’, tema de abertura da minissérie Hilda Furacão, da Rede Globo (1998) e ‘Suave veneno’, da novela Suave Veneno, Rede Globo (1999), ambas gravadas por Nana Caymmi.
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Em sua longa e profícua carreira, mais de 55 anos de trabalho, Cristovão recebeu 13 prêmios, entre eles o Prêmio Sharp como compositor, arranjador, instrumentista e melhor disco instrumental, com “Bons Encontros”, em parceria com Marco Pereira; Em 2008 recebeu o ‘Prêmio Tim’, como melhor arranjador com o disco “Paulinho da Viola – Acústico MTV”. Em 2011 o ‘Prêmio da Música Brasileira’ como melhor arranjador, com o disco “Tantas Marés” de Edu Lobo. Em 2018, recebe o ‘Prêmio da Música Popular Brasileira’ juntamente com Chico Buarque pela canção “Tua Cantiga”, na categoria ‘Melhor canção’; e em 2021 recebe Prêmio Ernesto Nazareth (1º lugar) do festival Rio Choro, para a sua música “Especial saudade“.  Ainda em 2021, recebe o Prêmio Profissionais da Música, na categoria ‘Intérpretes de Choro’, álbum Cristovão Bastos e Rogério Caetano* (selo Biscoito Fino, 2020), o disco também foi indicado ao Latin Grammy 2021, na categoria de melhor Álbum Instrumental.
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Lançou dois discos solo, o primeiro “Avenida Brasil”, em 1997 e o segundo “Gafieira Suburbana”, em 2008, contendo composições suas e de amigos.
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Em 1992, gravou o álbum premiado “Bons Encontros”, em parceria com Marco Pereira. Bastos. No ano de 2002, gravou o disco “Domingo na geral”, álbum com o grupo ‘Nó em Pingo D’Água’. Em 2019, gravou e lançou o álbum “Espelho” em parceria com Maury Buchala, pelo selo SESC SP. Em julho de 2020, lançou o disco em duo “Cristovão Bastos e Rogério Caetano“, pelo selo Biscoito Fino. O álbum promove o encontro de dois grandes mestres em seus instrumentos – o piano e o violão 7 cordas aço. Disco em homenagem a Raphael Rabello.
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Em outubro de 2022, lançou o disco em duo Choro negro – Cristovão Bastos e Mauro Senise tocam Paulinho da Viola, pelo selo Biscoito Fino, 2022. O álbum celebra os 80 anos de Paulinho da Viola, mestre da nossa música. Disco foi indicado ao Latin Grammy 2023, na categoria de melhor Álbum Instrumental. E em dezembro, lançou em parceria com João Lyra o álbum “Varandão”, selo Independente. São 10 composições de Lyra e Bastos, todas sob o título Varandão – de 1 a 10., sendo que a faixa 2, é composição só de Cristovão, e faixa 9, só de Lyra. Biografia completa: Cristovão Bastos

revistaprosaversoearte.com - Entrevista com o pianista, compositor e arranjador Cristovão Bastos, por Daniela Aragão
Cristovão Bastos – foto @elcioparaiso / @benditaconteudo

Eis a entrevista:

Daniela Aragão: Quando a música apareceu em sua vida?
Cristovão Bastos: Aos sete anos de idade numa apresentação de acordeonistas no bairro Marechal Hermes, em que nasci e morava. Falei com meu pai que queria estudar acordeon e no mês seguinte eu já estava numa academia começando a estudar.
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Daniela Aragão: E o piano?
Cristovão Bastos: O piano eu conheci na escola de acordeon, entrei numa escola para aprender acordeon aos sete anos, tinha nessa escola um piano que me chamou atenção e comecei a experimentar por pura curiosidade com uns dez para onze anos, e um pouco mais depois que eu me formei aos treze anos. Me formei em acordeon nessa escola que era de música, mas não consistia num conservatório, era como se fosse. A prova final acontecia no centro da cidade, não na escola em que eu estudava, em seguida vinha um diploma conferido pelo professor.

Daniela Aragão: Interessante observar o seu percurso que bate com a história da formação musical de outros pianistas como João Donato. Você fez a transição do acordeon para o piano, acordeon era um instrumento mais usual na época. O Sylvio Gomes passou por esse processo também.
Cristovão Bastos: Teve uma época em que o acordeon foi uma febre, tinham na escola em que estudei três ou quatro cabines destinadas ao estudo de acordeon. Tinha uma sala para teoria e solfejo. Aconteciam aulas de hora em hora e todos os horários eram preenchidos, imagine quatro professores dando aula, ao menos oito por dia.
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Daniela Aragão: Como apareceu sua faceta de compositor?
Cristovão Bastos: A composição apareceu cedo, a primeira de que me lembro aconteceu quando eu tinha uns dez anos e fiz uma música com um parceiro do meu professor de acordeon, ele se chamava Adilson. Ele fez uma letra e nós tocamos para a namorada dele que ficou fascinada pela música, e me lembro de um fato engraçado, estávamos justamente na casa dela compondo essa canção quando pedi uma água e ela falou: “-Essa água é abençoada”. Eu era uma criança e não consigo me lembrar da música.

Daniela Aragão: Você fez cedo a opção pelo piano, tinha já a convicção de que seria músico profissional ou foi um processo espontâneo?
Cristovão Bastos: Foi completamente espontâneo, eu não coloquei na minha cabeça que seria um músico de qualquer maneira. Acontece contudo que sempre fui absolutamente apaixonado por música, com dois meses de escola de música já tirava músicas da rádio e tocava, eu tinha uma curiosidade musical muito grande. Na escola pública tinha sempre a quadrilha do meio do ano, eu devia estar com uns dez anos de idade e me lembro de coisas assim, eu ia tocando e inventando a quadrilha, tocando coisas que não existiam. Eu nunca voltava para o mesmo tema, ia inventando, inventando. Acho que foi a primeira manifestação de que me recordo de improviso e de composição, pois eu ia criando temas, passagens, modulações e o interessante é que as pessoas não notavam, achavam que eu estava tocando música que já existia.
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Daniela Aragão: Já tem todo um lado do arranjador florescendo aí não é? Esse arranjador ainda menino que vinha introduzindo modulações, nuances muito próprias.
Cristovão Bastos : Acho que sempre tive cabeça de arranjador, posso falar do primeiro grupo em que trabalhei que era o do Crésio Augusto, que foi meu professor de acordeon. Essa minha primeira relação com o piano se deu através dele, porque ele tocava piano no grupo Crésio Augusto e seu conjunto, eu tocava acordeon, tinha um guitarrista, um baterista, um saxofonista. Tem coisas que considero de muita importância para mim, por exemplo esse primeiro grupo em que fui tocar onde o Crésio me apresentou a um cara chamado Pitanga, que tocava guitarra, mas sem nunca ter estudado teoria musical. Quando vi esse cara tocar fiquei fascinado e pensei: – pô, nunca vou tocar como esse cara! Eu observava esse cara que considero meu primeiro grande mestre. Um cara na qual aprendi muita coisa observando, eu chegava, via ele tocar, pedia para repetir o acorde e ele tocava mas não sabia explicar. O lance de tocar piano e acordeon são coisas diferentes pois o sistema cromático indica a diferença. O acordeon você encosta na tecla, o meu primeiro contato com o piano foi assim, eu ficava tentando tocar mas apanhava muito da mão esquerda. Comecei a tocar numa boate aos dezessete anos e nem poderia na verdade por não ter ainda dezoito. Eu não sabia o que faziam as moças que trabalhavam na noite, tamanha a minha ingenuidade. Um dia o dono da boate falou que o pianista iria embora e perguntou se eu sabia tocar, daí me introduzi na carreira de pianista. Eu sabia colocar a mão no piano, mas tocar era outra história e resolvi no peito, trabalhei um tempo nessa boate e depois comecei a tocar num conjunto. Começou assim em Cascadura, num gesto bem juvenil.

Daniela Aragão: Corajoso
Cristovão Bastos: Por outro lado eu me lembro que eu tocava acordeon
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Daniela Aragão: Você é um pianista que construiu sua formação de maneira autodidata?
Cristovão Bastos: Completamente, embora sempre tenha o diálogo com outros músicos, informações compartilhadas.
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Daniela Aragão: Você tem composições com vários parceiros como Aldir Blanc, Paulinho da Viola, Elton Medeiros, Ana Terra e Abel Silva.
Cristovão Bastos: Tenho uma parceria somente de choros com Paulinho da Viola, nesse tempo nosso de parceria temos quatro músicas juntos. Ele é meu compadre, padrinho do meu filho mais velho, o Alan.
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Daniela Aragão: Com cada parceiro implica uma construção musical diferente?

Cristovão Bastos: Eu acho que não. Quando mostro uma música para um parceiro e ele gosta, a minha responsabilidade acabou. Então quando um parceiro me dá uma letra para eu musicar, a responsabilidade dele também acabou. É assim com Ana Terra, Sérgio Natureza, Paulo César Pinheiro. Do jeito que você faz a pergunta imagino que você queira dizer quando a parceria acontece junto.

Daniela Aragão: Pois é, Aldir é um, Ana Terra é outra, Paulo César, Chico Buarque, cada um com sua singularidade. Esses encontros são com pessoas diferentes que trazem suas próprias marcas.
Cristovão Bastos: Uma mesma música que eu desse para Aldir, Ana Terra ou Paulinho a diferença estaria por conta do parceiro.
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Daniela Aragão: Se por exemplo você está num processo mútuo?
Cristovão Bastos: Isso vai se dar na empatia. Você pode inverter o processo assim: se uma pessoa dá uma letra para mim e a mesma letra para Paulinho da Viola.

Daniela Aragão: Aproveito para te perguntar sobre suas duas belíssimas composições que já se tornaram de certa maneira antologizadas: Resposta ao Tempo, com Aldir Blanc e Todo o sentimento, com Chico Buarque.
Cristovão Bastos: As duas músicas eu mostrei para os parceiros quando já estavam prontas e havia passado um certo tempo. Todo o sentimento, quando mostrei para o Chico, talvez já tivesse passado uns dois meses. Mostrei primeiro para a Miúcha que gostou muito.
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Daniela Aragão: A gravação de Nana de ‘Resposta ao Tempo’ é única, sublime, fica difícil imaginar outras depois dessa.
Cristovão Bastos: Um arranjo feito pelo próprio compositor que trabalhava com Nana, eu já devia fazer coisas com Nana há uns dez anos quando essa música foi feita. Nós temos uma afinidade musical muito grande, não tem explicação para o que eu senti quando fiz esse arranjo, é uma coisa de momento, essa eu cheguei no estúdio e cinco minutos depois fiz a introdução.
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Daniela Aragão: Interessante você ter me dito ontem que a introdução tem uma marca tão densa e impactante que quando você toca as primeiras notas o grande público de imediato reconhece e corresponde efusivamente.
Cristovão Bastos: Dá um frisson na plateia, tem aquelas meninas que gostam. Não foi uma música pensada pracaramba e nem feita para a minissérie. Eu acho que essa música tem a força dela embora a televisão seja um veículo legal.

Daniela Aragão: Interessante é que tanto Todo o Sentimento quanto Resposta ao tempo trazem a marca do tempo e vista por dois grandes compositores que são Chico Buarque e Aldir Blanc. Em Todo o Sentimento se tem a marca da vivência do tempo de uma relação amorosa, a história de um casal, enquanto em Resposta ao tempo se tem o tempo em sua dimensão ampla, existencial, metafísica. Você parece trazer essa sugestão da temporalidade em sua música.
Cristovão Bastos: Eu compus Raio de Luz com Abel Silva, canção que foi até tema de uma novela, é absolutamente leve: “Você chegou, iluminou o meu olhar”. Foi gravada pela Barbra Streisend, ela gravou com um arranjo lindo. Eu coloco muita música no facebook, certa vez um cara disse por lá que o arranjo era pasteurizado. Que coisa bonita que a Barbra fez e a madrinha da música foi Itamara Koorax, que levou para o Abel. Suave Veneno foi encomenda.
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Daniela Aragão: E Cinquenta anos, sua parceria com Aldir?
Cristovão Bastos: Ele estava fazendo o disco 50 anos e me pediu uma canção, aí eu mandei essa canção para ele, que se tornou a canção do disco. Ele me ligou as duas ou três da madrugada.
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Daniela Aragão: Eu acho que essa canção tem um eu muito marcadamente masculino por isso considero antológica a gravação do Paulinho da Viola.

revistaprosaversoearte.com - Entrevista com o pianista, compositor e arranjador Cristovão Bastos, por Daniela Aragão
Daniela Aragão

** Daniela Aragão (1975) é doutora em literatura brasileira pela Puc-Rio, cantora e pesquisadora musical. Há mais de duas décadas desenvolve trabalhos sobre a história do cancioneiro brasileiro, com trabalhos publicados no Brasil e no exterior. Gravou em 2005 o disco “Daniela Aragão face A Sueli Costa face A Cacaso”. Há mais de uma década realiza entrevistas com músicos de Juiz de Fora e de estatura nacional. Entre os entrevistados estão: Sergio Ricardo, Roberto Menescal, Joyce Moreno, Delia Fischer, Márcio Hallack, Estevão Teixeira, Cristovão Bastos, Robertinho Silva, Alexandre Raine, Guinga, Angela Rô Rô, Lucina, Turíbio Santos… Seu livro recém lançado “De Conversa em Conversa” reúne uma série de crônicas publicadas em jornais e revistas (Cataguases, AcheiUSA, Suplemento Minas, O dia, Revista Revestrés, Cronópios…) ao longo de quinze anos. Os textos de Daniela Aragão são reconhecidos no meio musical devido a sua considerável marca autoral e singularidade, cuja autora analisa minuciosamente e com lirismo obras de compositores e cantores como Gilberto Gil, Caetano Veloso, Chico Buarque, Rita Lee. O livro possui a orelha escrita pelo poeta Geraldo Carneiro, prefácio do pesquisador musical e professor da Puc-Rio Júlio Diniz, contracapa da cantora e compositora Joyce Moreno e do pianista e arranjador Cristovão Bastos. Irá lançar em 2022 seu livro “São Mateus – num tempo de delicadezas”.  Colunista da Revista Prosa, Verso e Arte. #* Biografia completa AQUI!
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