Literatura

‘Peço silêncio’ – um precioso poema de Pablo Neruda

A poesia de Pablo Neruda vem das forças da terra, uma presença única debruçada sobre o oceano de suas inquietações. E o quão é difícil eleger os versos mais belos de Pablo Neruda. Isso porque Neruda confunde-se com a própria poesia, ele é o poema em pessoa. Ele cantou o mar, a terra, o vento, a chuva, as estações, o amor despedaçado, ele cantou as estrelas e o infinito, as águas e os pássaros, a fruta e a flor. Cantou a alegria de viver e também a noite definitiva. A sua história está nos versos de: ‘Crepusculario’, ‘Veinte Poemas de Amor’ e ‘Una Canción Desesperada’, ‘Canto General’, ‘Estravagario’, ‘Cien Sonetos de Amor’, ‘Memorial de Isla Negra’ etc.

“Pido Silencio”, o poema que  traduz os sentimentos mais profundos do poeta. Leia e ouça na voz do poeta: 

PEÇO SILÊNCIO
AGORA me deixem tranquilo.
Agora se acostumem sem mim.

Eu vou cerrar os meus olhos.

Somente quero cinco coisas,
cinco raízes preferidas.

Uma é o amor sem fim.

A segunda é ver o outono.
Não posso ser sem que as folhas
voem e voltem à terra.

O terceiro é o grave inverno,
a chuva que amei, a carícia
de fogo no frio silvestre.

Em quarto lugar o verão
redondo como uma melancia.

A quinta coisa são teus olhos,
Matilde minha, bem-amada,
não quero dormir sem teus olhos,
não quero ser sem que me olhes:
eu mudo a primavera
para que me sigas olhando.
Amigos, isso é quanto quero.
É quase nada e quase tudo.

Agora se querem, podem ir.

Vivi tanto que um dia
terão de por força me esquecer,
apagando-me do quadro negro:
Meu coração foi interminável.

Porém, por que peço silêncio
não creiam que vou morrer:
passa comigo o contrário:
sucede que vou viver.

Sucede que sou e que sigo.

Não será, pois lá bem dentro
de mim crescerão cereais,
primeiro os grãos que rompem
a terra para ver a luz,
porém, a mãe-terra é escura:
e dentro de mim sou escuro:
sou como um poço em cujas águas
a noite deixa suas estrelas
e segue sozinha pelo campo.

Sucede que tanto vivi
que quero viver outro tanto.

Nunca me senti tão sonoro,
nunca tive tantos beijos.

Agora, como sempre, é cedo.
Voa a luz com suas abelhas.

Me deixem só com o dia.
Peço licença para nascer.

PIDO SILENCIO
AHORA me dejen tranquilo.
Ahora se acostumbren sin mí.

Yo voy a cerrar los ojos

Y sólo quiero cinco cosas,
cinco raices preferidas.

Una es el amor sin fin.

Lo segundo es ver el otoño.
No puedo ser sin que las hojas
vuelen y vuelvan a la tierra.

Lo tercero es el grave invierno,
la lluvia que amé, la caricia
del fuego en el frío silvestre.

En cuarto lugar el verano
redondo como una sandía.

La quinta cosa son tus ojos,
Matilde mía, bienamada,
no quiero dormir sin tus ojos,
no quiero ser sin que me mires:
yo cambio la primavera
por que tú me sigas mirando.

Amigos, eso es cuanto quiero.
Es casi nada y casi todo.

Ahora si quieren se vayan.

He vivido tanto que un día
tendrán que olvidarme por fuerza,
borrándome de la pizarra:
mi corazón fue interminable.

Pero porque pido silencio
no crean que voy a morirme:
me pasa todo lo contrario:
sucede que voy a vivirme.

Sucede que soy y que sigo.

No será, pues, sino que adentro
de mí crecerán cereales,
primero los granos que rompen
la tierra para ver la luz,
pero la madre tierra es oscura:
y dentro de mí soy oscuro:
soy como un pozo en cuyas aguas
la noche deja sus estrellas
y sigue sola por el campo.

Se trata de que tanto he vivido
que quiero vivir otro tanto.

Nunca me sentí tan sonoro,
nunca he tenido tantos besos.

Ahora, como siempre, es temprano.
Vuela la luz con sus abejas.

Déjenme solo con el día.
Pido permiso para nacer.
– Pablo Neruda, em “Presentes de um Poeta”. [tradução Thiago de Mello]. São Paulo: Vergara & Riba, 2001. {publicado no livro ‘Estravagario’ (1958), poema escrito em agosto de 1957}.

Ouça Neruda:

Saiba mais sobre Pablo Neruda:

Pablo Neruda (outros poemas, textos e entrevista)
Pablo Neruda – entrevistado por Clarice Lispector
Pablo Neruda – poemas do livro “Crepusculário” (bilíngue português-espanhol)

Revista Prosa Verso e Arte

Literatura - Artes e fotografia - Educação - Cultura e sociedade - Saúde e bem-estar

Recent Posts

Andiara Mumbach e Marcel Estivalet lançam seu primeiro álbum ‘Poesia Brasileira’

Intitulado Poesia Brasileira, o disco une a precisão vocal da cantora lírica com o toque…

8 horas ago

Espetáculo ‘Vida útil’ chega ao Teatro Glauce Rocha

Para rir e pensar: sucesso de público e crítica, “Vida útil” chega ao Teatro Glauce…

9 horas ago

Estrelada por Adriana Birolli, comédia “Não” prorroga temporada no Teatro Claro Mais RJ

Sucesso pelo Brasil já visto por mais de 10 mil pessoas, peça reflete sobre as…

10 horas ago

Cia de Achadouros apresenta ‘Os Lavadores de Histórias’ no Espaço Cultural Praia, em Bertioga

Inspirado nas poesias de Manoel de Barros, o espetáculo une circo, teatro de sombras e…

10 horas ago

‘Enquanto você voava, eu criava raízes’ faz nova temporada no Teatro Vivo

Depois de grande sucesso e de levar cerca de 5 mil pessoas ao espetáculo em…

11 horas ago

Bia Lucca apresenta Tributo a Nara Leão, no Teatro Brigitte Blair Rio de Janeiro

Uma viagem sonora ao passado com destino às estações das diversas fases da carreira de…

12 horas ago