“Brinquedos do infinito” é uma obra que promove a circulação livre e gratuita de poemas coletivos. São 34 poemas, feitos ao longo de um intervalo dez anos, por oito poetas. Por isso dizemos que é um livro feito a 16 mãos. No entanto, a esmagadora maioria dos poemas foram escritos em dupla, e apenas dois foram escritos em trio.

Além de liberdade e do aspecto lúdico do fazer poético, como o título denuncia, outra vertente da obra aponta para o questionamento do foco dado à figura do autor. Poemas em dupla são, por si, um questionamento à ideia da primazia do autor. Além disso, os três primeiros poemas, que constituem, não por acaso, a apresentação da obra, versam mais direta e criticamente sobre este tema.

“De tanto tentar, em vão,
escravizar as palavras,
elas ainda matarão
os tolos poetas
e queimarão suas casas.
[…]
Celebremos, pois, a palavra,
suas cambalhotas e peripécias,
que, como os persas, nos navegam
em pleno silêncio.” – André Setti – 2016

Os poemas a dezesseis mãos, são dos poetas André Setti, Wagner Andriote, Felipe Stefani, Lívia Prado, Maiara Gouveia, Marcelo Roque, Pedro Tostes e Tiago Rabelo, com ilustrações e foto de Felipe Stefani e organização do poeta André Setti. Você pode baixar o livro “Brinquedos do infinito” gratuitamente (pdf): AQUI! Você também contacta-los através do e-mail que consta no final do livro ou encontra-los nas redes sociais.

Leia aqui cinco poemas do livro:

POÉTICA
A poesia é mesmo um caso sério:
vez por outra vai parar no cemitério.
E sempre volta, como um
zumbi literário.
A poesia brasileira anda broxa,
não mata a cobra,
esconde o pau
e espera ansiosamente
pelo próximo edital.

A poesia brasileira contemporânea
é esquizofônica;
uma hora fala duro,
na outra difícil (e demonstra
pouca propensão a atirar-se
de edifícios)

A poesia brasileira corrente é polida,
faz foto pra cartaz, gosta
de ser notícia no jornal, do caderno
de resenhas, é bonita
limpinha, correta e erra pouco.
Fuma, mas não traga.
– Pedro Tostes – 2013

§§

EMBARCAÇÃO
A voz dessas palavras
sacode-me como ondas
num brusco rochedo.

Eis uma esperança para o infinito,
se ele souber
cantarolar desassossegos
entre as névoas do ébrio desterro.

A vida, filho,
é uma neblina
e uma embarcação.
– Tiago Rabelo, Felipe Stefani e André Setti – 2016

TEATRO DAS ÁGUAS
Dentro do abismo colorido
de ontem à noite,
não sei porquê canto
quando te vejo.

Talvez o mar, a esmo,
signo indecifrável das águas,
no tormento da tua imagem,
nos rochedos do pensamento,
em calmas ondas traga a razão,
lúcido instante, azul reflexão,
na transparência do amor,
nos ossos loucos do mar,
e enfim a fusão
das ondas do corpo
com o teatro das águas.

Onde há canto
não há mágoa,
e o corpo do mar
sabe que o infinito é pouco
para o seu intento.
– Lívia Prado, Wagner Andriote e André Setti – 2017

§§

CADAVRE EXQUIS
Noite ou dia: procuro seu nome.
A filosofia dos corpos
despedaça as notícias.
Nada retorna com esta força turva:
o caleidoscópio de relâmpagos
sobre seu nome violeta.
Assombro, susto, gozo.
Nada sei que não me pertence.
A dança desses palhaços, tambores, alarmes,
de tanto se espalhar, incendeia:
tango entre as miragens violentas,
pés acelerados entre o antes e o instante,
embriagados por cenas fartamente líricas,
tessitura do acúmulo de espasmos,
violinos quebrados,
dos silêncios insuspeitos na memória dos acasos.

E ainda não sei seu nome.
Tateio suas pistas de estrela na órbita
desses dias de chuva e espanto.
Os dedos espalmados sobre seu nome oculto
espalham imagens movediças, sensações vagas.
E tudo é música inventada pela doçura
dos corpos ébrios,
substância nítida,
a quintessência da cegueira,
esta memorável melodia,
feita de ossos e faíscas.
– Maiara Gouveia e André Setti – 2016

§§

INSONE
Meu reino
loucamente gira,
feito um palhaço
de nome e espinho do infinito.

Por vezes tenho horas
que têm séculos,
e arrebato-me nesse mistério
de ser e perecer,
padecer entre ilusões
de liberdade e beleza.

Meu reino
de pescoços e sonhos,
que flertam com guilhotinas,
sóis noturnos
e insones esperanças,
em que o zumbido das horas
estilhaça os dias,
e os pássaros
dão profundidade ao abismo.
– Marcelo Roque e André Setti – 2017

 







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