“Elizabeth Barrett Browning (1806 – 1861) é quase que uma poeta nacional. Chamada carinhosamente por Mário de Andrade de Belinha Barreto, a autora encontrou nas mãos de Manuel Bandeira um intérprete que a fez se tornar um clássico quase tão firme quanto o é em sua língua de partida. Certo que existe todo um debate se as traduções de Bandeira são traduções mesmo; se olharmos de maneira mais detida, vamos observar que estão mais para paráfrases. Seja como for, é inegável a felicidade das recriações, ponhamos assim, de Bandeira, tanto que, sem espanto nenhum, ele incluiu algumas de suas traduções da autora (ao todo quatro) dentro do coração de sua obra: Libertinagem.

Sua vida mudou inteiramente quando conheceu Robert Browning, o grande poeta vitoriano. Aí foi uma história de amor danada de linda, com direito a casamento escondido e troca de poemas, especialmente por parte de Elizabeth, até o momento em que ela conseguiu engravidar e viver sua vida curta de maneira alegre e pacata.

Do cortejo amoroso que travou com Robert, surgiram os Sonetos da portuguesa. Ao todo 44, são certamente uma das coletâneas poéticas mais queridas de toda a história da língua inglesa. Postos comumente ao lado de Shakespeare, é de se notar o apreço especial que Elizabeth tinha para com nosso Camões, donde uma das possibilidades de análise do título original (Sonnets from the portuguese).” – Matheus de Souza “Mavericco” Almeida | Escamandro

Eis, o Poema/Soneto:

Soneto 43
Amo-te quando em largo, alto e profundo
Minh’alma alcança quando, transportada,
Sente, alongando os olhos deste mundo,
Os fins do Ser, a Graça entressonhada.

Amo-te em cada dia, hora e segundo:
À luz do sol, na noite sossegada.
E é tão pura a paixão de que me inundo
Quanto o pudor dos que não pedem nada.

Amo-te com o doer das velhas penas;
Com sorrisos, com lágrimas de prece,
E a fé da minha infância, ingênua e forte.

Amo-te até nas coisas mais pequenas.
Por toda a vida. E, assim Deus o quisesse,
Ainda mais te amarei depois da morte.

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Sonnets from the Portuguese, nº 43
How do I love thee? Let me count the ways.
I love thee to the depth and breadth and height
My soul can reach, when feeling out of sight
For the ends of Being and ideal Grace.

I love thee to the level of everyday’s
Most quiet need, by sun and candlelight.
I love thee freely, as men strive for Right;
I love thee purely, as they turn from Praise.

I love thee with the passion put to use
In my old griefs, and with my childhood’s faith.

I love thee with a love I seemed to lose
With my lost saints,—I love thee with the breath,
Smiles, tears, of all my life!—and, if God choose,
I shall but love thee better after death.
– Elizabeth Barrett Browning, [tradução Manuel Bandeira]. in: BANDEIRA, Manuel. ‘Estrela da vida inteira’. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2007. {“Sonnets from the Portuguese, nº 43′ – Poema originalmente publicado em 1850}.

Elizabeth Barrett Browning (1806 – 1861)*

revistaprosaversoearte.com - 'Amo-te até nas coisas mais pequenas. Por toda a vida.'
Elizabeth Barrett Browning – by Michele Gordigiani (1858)

Elizabeth Barrett Moulton-Barrett, nascida em 1806, ela foi autora de alguns livros de poesia, dos quais podemos comentar a sua impressionante juvenília The Battle of Marathon (1820, um poema em imitação homérica, imaturo ainda, claro, mas mesmo assim melhor do que qualquer coisa que qualquer um de nós teria escrito aos 14) e An Essay on Mind, with Other Poems (1826), mais a tradução de Ésquilo Prometheus Bound (1833, depois revisada, melhorada e republicada em 1838) e depois os volumes The Seraphim and Other Poems (1838) e Poems (1844) – que fez com que ela ficasse famosa praticamente da noite para o dia em todo o mundo anglófono. Como coloca a sua biografia no site da Poetry Foundation, foi então que ela deixou de ser só mais uma “jovem poeta promissora” e se tornou uma “celebridade internacional”, “aclamada como uma das grandes vozes vivas da Inglaterra”. Por causa desse livro, Robert Browning (6 anos mais novo que ela, aliás) se interessou por Elizabeth e começou a lhe escrever, e foi essa relação entre os dois que inspirou os seus “Sonnets from the Portuguese”, um ciclo de sonetos amorosos disfarçados como traduções do português (tanto por motivos de privacidade quanto por causa da admiração dos dois poetas por Camões). O título é um pouco complicado de traduzir, já que pode ser entendido como “sonetos dos portugueses”, “sonetos (traduzidos) do (idioma) português” ou “sonetos da portuguesa”, considerando a perspectiva feminina deles e que “minha portuguesinha” era um dos apelidos carinhosos que Robert tinha por Elizabeth (não me perguntem). Escrito entre 45 e 46, ano em que os dois se casam, esse ciclo de sonetos foi incluído na reedição de 1850 de Poems. Ela também depois escreve o longo poema narrativo Aurora Leigh (1857), em 9 livros, e o seu último volume publicado chama Last Poems (1862), organizado por Robert um ano após a sua morte precoce, causada por uma doença misteriosa e o seu tratamento com láudano (ópio em solução alcoólica) que lhe deixou com a saúde ainda mais debilitada.

Do outro lado do Atlântico, Elizabeth foi uma influência imensa para poetas como Edgar Allan Poe e Emily Dickinson e, em nosso idioma, foi admirada e traduzida por figuras como Pessoa e Bandeira. De meu conhecimento, temos pelo menos três volumes de traduções de poemas dela: Sonetos da Portuguesa, de Leonardo Fróes (ed. Rocco), e Três Mulheres Apaixonadas, de Sérgio Duarte (Companhia das Letras), num volume que inclui, junto da Browning, também traduções de Gaspara Stampa e Louise Labé – e a esses dois volumes, soma-se também uma tradução em português lusitano chamada Sonetos Portugueses, de Manuel Corrêa de Barros (ed. Relógio d’Água).

Fonte e leia mais em: (*) Escamandro







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