Vivemos numa sociedade de informações que nos satura indiscriminadamente com dados, todos no mesmo nível, e que termina por nos levar a uma tremenda superficialidade no momento de introduzir questões morais. Em consequência, torna-se necessária uma educação que ensine a pensar criticamente e ofereça um percurso de amadurecimento nos valores.
– Papa Francisco no livro “Quem sou eu para julgar?” [reunido e editado por Anna Maria Foli; tradução de Clara A. Colotto]. LeYa, 2017.
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Também o ambiente social tem suas feridas. Mas todas são causadas, no fundo, pelo mesmo mal, isto é, pela ideia de que não existem verdades indiscutíveis que guiam a nossa vida e que, por isso, a liberdade humana não tem limites.
[Laudato si’]
– Papa Francisco no livro “Quem sou eu para julgar?” [reunido e editado por Anna Maria Foli; tradução de Clara A. Colotto]. LeYa, 2017.
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AS CONSEQUÊNCIAS DA PROVOCAÇÃO
Em teoria, podemos dizer que uma reação violenta diante de uma ofensa, de uma provocação, em teoria, sim, não é algo bom, não se deve fazer. Em teoria, podemos dizer aquilo que o Evangelho diz, que devemos dar a outra face. Em teoria podemos dizer que temos liberdade de expressão e ela é importante. Na teoria estamos todos de acordo.
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Mas somos humanos e há a prudência, que é uma virtude da convivência humana. Não posso insultar, provocar uma pessoa continuamente, porque arrisco enraivecê-la, arrisco receber uma reação errada, errada. Mas isso é humano. Por isso digo que a liberdade de expressão deve levar em conta a realidade humana e por essa razão deve ser prudente. É um modo de dizer que deve ser também educada. Prudente. A prudência é a virtude humana que regula nossas relações. Posso andar até aqui, não posso ir para lá…
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Eu queria dizer que, em teoria, estamos todos de acordo: há liberdade de expressão, uma reação violenta não é boa, sempre é ruim. Todos estão de acordo. Mas, na prática, tenhamos calma, porque somos humanos e arriscamos provocar os outros, e por isso a liberdade deve ser acompanhada da prudência.
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[Conferência jornalística durante o voo de retorno das Filipinas, 19 de janeiro de 2015]
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Do livro “Quem sou eu para julgar?” / Chi sono io per giudicare?’ / Papa Francisco [reunido e editado por Anna Maria Foli; tradução de Clara A. Colotto]. Rio de Janeiro: LeYa, 2017.
LIBERDADE DE EXPRESSÃO
Em primeiro lugar, não se pode esconder uma verdade: cada um tem o direito de praticar a própria religião livremente. Assim é, todos queremos desse modo. Segundo, não se pode ofender, fazer a guerra, matar em nome da própria religião, isto é, em nome de Deus. O que acontece atualmente nos deixa assombrados. Porém, pensemos sempre na nossa história: quantas guerras de religião tivemos! Também nós fomos pecadores nesse sentido. Contudo, não se pode matar em nome de Deus.
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Matar em nome de Deus é uma aberração. Creio que isso seja a coisa mais importante sobre a liberdade religiosa: deve-se praticar a religião com liberdade, sem ofender, sem impor e sem matar.
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Não se pode provocar, não se pode insultar a fé dos outros, não se pode brincar com a fé. O Papa Bento, num discurso, havia falado dessa mentalidade pós-positivista, da metafísica pós-positivista, que levava, ao fim, a crer que as religiões ou as expressões religiosas são uma espécie de subcultura, que são toleradas, mas têm pouco significado, não fazem parte da cultura iluminada. Essa é uma herança do Iluminismo.
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Muita gente fala mal das religiões, ridiculariza a religião dos outros. Essas pessoas provocam. Há um limite.
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Toda religião tem dignidade, toda religião que respeite a vida humana, a pessoa humana, tem dignidade e não posso ridicularizá-la. Esse é um limite.
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[Conferência jornalística durante o voo para Manila, 15 de janeiro de 2015].
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Do livro “Quem sou eu para julgar?” / ‘Chi sono io per giudicare?’ / Papa Francisco [reunido e editado por Anna Maria Foli; tradução de Clara A. Colotto]. Rio de Janeiro: LeYa, 2017.

ALÉM DO PRESENTE
Falar à pessoa inteira: é uma das tarefas fundamentais do comunicador. Evitando aqueles que são os pecados dos meios de comunicação: a desinformação, a calúnia e a difamação. Esses são os três pecados dos meios de comunicação.
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A desinformação, em particular, leva a dizer as coisas pela metade e isso leva a não se conseguir fazer um juízo preciso sobre a realidade. Uma comunicação autêntica não está preocupada em “impressionar”: a alternância entre alarmismo catastrófico e desempenho consolador, dois extremos que continuamente vemos propostos na comunicação moderna, não é um bom serviço que os meios de comunicação possam oferecer às pessoas.
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É preciso falar às pessoas em sua inteireza: à sua mente e ao seu coração, para que saibam ver além do imediato, além de um presente temeroso e que corre o risco de perder a memória.
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Dos três pecados — a desinformação, a calúnia e a difamação —, a calúnia parece ser o mais grave, mas, na comunicação, o mais grave é a desinformação, porque leva você a cometer um erro, leva você a se enganar, leva você a acreditar somente numa parte da verdade.
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[Discurso, 15 de dezembro de 2014]
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Do livro “Quem sou eu para julgar?” [Chi sono io per giudicare?] / Papa Francisco [reunido e editado por Anna Maria Foli; tradução de Clara A. Colotto]. Rio de Janeiro: LeYa, 2017.
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A LÓGICA DO “USA E JOGA FORA”
Quando o ser humano se coloca no centro, acaba por dar prioridade absoluta aos seus interesses contingentes e tudo o mais se torna relativo. Por isso não deveria causar surpresa o fato de que se desenvolva, nos indivíduos, esse relativismo no qual tudo o que não serve aos próprios interesses imediatos se torna irrelevante.
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A cultura do relativismo é a mesma patologia que impele uma pessoa a aproveitar-se de outra e a tratá-la como mero objeto, obrigando-a a trabalhos forçados ou reduzindo-a à escravidão por causa de uma dívida.
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É a mesma lógica que leva à exploração sexual das crianças ou ao abandono dos idosos que não servem aos próprios interesses. É também a lógica interna daqueles que dizem: “Deixemos que as forças invisíveis do mercado regulem a economia, porque os seus efeitos sobre a sociedade e a natureza são danos inevitáveis”.
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Se não há verdades objetivas nem princípios estáveis fora da satisfação das aspirações próprias e das necessidades imediatas, que limites pode haver para o tráfico de seres humanos, a criminalidade organizada, o narcotráfico, o comércio de diamantes ensanguentados e de peles de animais em vias de extinção? Não é a mesma lógica relativista a que justifica a compra de órgãos dos pobres com a finalidade de vendê-los ou utilizá-los para experimentação, ou o descarte de crianças porque não servem ao desejo de seus pais?
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É a mesma lógica do “usa e joga fora” que produz tantos resíduos, só pelo desejo desordenado de consumir mais do que realmente se tem necessidade.
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Portanto, não podemos pensar que os programas políticos ou a força da lei sejam suficientes para evitar os comportamentos que afetam o meio ambiente, porque, quando a cultura se corrompe e não se reconhece mais nenhuma verdade objetiva ou princípios universalmente válidos, as leis serão entendidas somente como imposições arbitrárias e como obstáculos a serem evitados.
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[Laudato si’, n. 122-123].
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Do livro “Quem sou eu para julgar?” [Chi sono io per giudicare?] / Papa Francisco [reunido e editado por Anna Maria Foli; tradução de Clara A. Colotto]. Rio de Janeiro: LeYa, 2017.
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